Pessoas em Situação de Rua em Campinas: Um Desafio Complexo e Urgente
- Paulo Gaspar
- 8 de jan.
- 4 min de leitura
Atualizado: há 3 dias

Diversos fatores contribuem para que uma pessoa viva em situação de rua, incluindo rompimento de vínculos familiares, violência doméstica, alcoolismo, dependência química, problemas de saúde mental, dificuldades financeiras e desilusões.
No Brasil, estima-se que cerca de 300 mil pessoas vivam nessa condição, segundo dados do CadÚnico. Surpreendentemente, 90% delas são alfabetizadas e 68% já tiveram emprego formal.
Este é um problema estrutural, profundamente enraizado na história do Brasil, marcado por mais de 500 anos de desigualdade social e 350 anos de escravidão, fatores que contribuíram significativamente para a atual situação. A questão se manifesta em três níveis: global, nacional e municipal.
A dependência química afeta cerca de 80% dessa população, impulsionando o aumento contínuo desse contingente. O tráfico internacional de drogas ilícitas, um problema global complexo e de difícil solução, é um dos principais fatores que contribuem para esse crescimento.
A maioria das pessoas em situação de rua é migrante, itinerante e flutuante, ou seja, não possui residência fixa nos municípios. Podemos constatar a presença de pessoas oriundas de outros estados, morando em diversas cidades brasileiras (diferente do local de origem). Essa característica torna a questão uma responsabilidade compartilhada entre a União e os Estados, que detêm maior capacidade de investimento em políticas públicas e programas sociais, como os oferecidos pelo SUS (Sistema Único de Saúde) e SUAS (Sistema Único de Assistência Social).
Em Campinas, o Censo de 2024 da Secretaria de Desenvolvimento e Assistência Social contabilizou 1.300 pessoas em situação de rua, um aumento de 39,48% em relação a 2021 (932 pessoas). No entanto, ONGs que atuam diretamente com essa população estimam que o número real seja pelo menos o dobro. Campinas se destaca por ser a única cidade não capital entre as dez com maior concentração de população em situação de rua no Brasil.
O município, por meio das secretarias de Assistência Social, Saúde, Trabalho e Habitação, tem o papel de atender essa demanda. Durante meu mandato como vereador em Campinas (2021-2024), presidi a Comissão da População em Situação de Rua e constatamos as dificuldades do governo municipal em lidar com a situação, devido à falta de prerrogativas, recursos e gestão adequada.
As forças policiais estadual e municipal enfrentam dificuldades no combate ao tráfico de drogas e à criminalidade, devido à falta de recursos humanos, equipamentos e verbas, além da legislação federal que, frequentemente, resulta na rápida libertação de criminosos, tornando o trabalho policial menos eficaz.
A área da saúde é vital para a recuperação de pessoas com dependência química e transtornos mentais. O Instituto Padre Haroldo oferece acolhimento residencial, tratamento, recuperação, prevenção, educação, trabalho e renda para pessoas em situação de vulnerabilidade social e de saúde. O Instituto também presta outros serviços como a Casa da Gestante (Saúde) e a Casa de Passagem (Assistência Social).
A Casa da Gestante acolhe gestantes e puérperas maiores de 18 anos e seus bebês em situação de vulnerabilidade social, oferecendo proteção e cuidado integral em saúde, incluindo pré-natal qualificado, assistência ao parto, incentivo ao aleitamento materno, reconstrução e fortalecimento de vínculos familiares e sociais, projetos de geração de renda e construção de projetos de vida para a autonomia da mãe.
As principais deficiências de atendimento em Campinas concentram-se nos CAPS (Centros de Atenção Psicossocial), que apresentam estrutura precária, falta de profissionais e gestão ineficiente, levando muitos pacientes a desistirem do tratamento.
O Consultório na Rua (Serviço prestado pelo Cândido Ferreira) oferece cuidados de saúde a pessoas em situação de rua em seus próprios contextos de vida, por meio de uma equipe multidisciplinar composta por médicos, psicólogos, assistentes sociais, auxiliares de enfermagem, enfermeiros e redutores de danos. O serviço foca em doenças como tuberculose e alcoolismo, além do combate ao crack e outras drogas, oferecendo orientações sobre doenças sexualmente transmissíveis e hepatites, realizando curativos, testes de diabetes e aferição de pressão arterial.
A rede socioassistencial, composta por serviços públicos e conveniados, inclui o SOS Rua (Serviço prestado pela Associação Cornélia), que realiza abordagem social e busca ativa de pessoas em situação de rua, com equipe multidisciplinar atuando das 8h às 22h, realizando identificação, construção de vínculos, encaminhamentos para o Cadastro Único, ações preventivas, parcerias com o Consultório de Rua e planejamento de ações articuladas com a segurança pública.
Os CENTRO-POP I e II oferecem atendimento especializado, incluindo acolhida, escuta qualificada, orientação para documentação, compreensão da situação de rua, incentivo à participação social e oferta de cuidados de higiene, vestuário e alimentação.
O Abrigo Institucional oferece acolhimento provisório em ambiente adequado, com segurança, acessibilidade e privacidade, visando a elaboração de um novo projeto de vida.
O SAMIM (Serviço de Atendimento ao Migrante, Itinerante e Mendicante) oferece acolhimento emergencial com necessidades básicas de higiene, alimentação e pernoite.
A Casa de Passagem (Instituto Padre Haroldo) oferece acolhimento transitório com cuidados de higiene, saúde, alimentação, vestuário, documentação e apoio à construção do processo de saída das ruas.
A Casa da Cidadania oferece refeições, espaço de convivência e higiene, além de encaminhamentos para serviços de saúde e assistência social, em parceria com o SOS Rua e a Guarda Municipal.
Campinas não aderiu ao Plano Nacional Ruas Visíveis, perdendo a oportunidade de obter mais recursos. O plano contempla medidas em sete eixos: Assistência Social e Segurança Alimentar; Saúde; Violência Institucional; Cidadania, Educação e Cultura; Habitação; Trabalho e Renda; e Produção e Gestão de Dados, com articulação entre 11 ministérios, governos estaduais e municipais, movimentos sociais, poderes Legislativo e Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, sociedade civil organizada e o setor empresarial.
Enquanto vereador, protocolei o projeto "Moradia Primeiro", inspirado em modelos internacionais, que garante moradia temporária (pensão, república ou kitinete) subsidiada pelo Estado durante o tratamento e capacitação, até a alta, quando a vaga é disponibilizada para outra pessoa. Este projeto, com resultados positivos em outros locais, segue o princípio da economicidade e da redução de danos, sendo mais eficaz e econômico tratar a causa do que a consequência. Contamos com a presença do Diretor de Promoção dos Direitos da População em Situação de Rua, Leo Pinho, que veio de Brasília para apoiar nossa ação. Infelizmente, o projeto tramita lentamente na Câmara Municipal de Campinas.
Este é o diagnóstico da complexa situação, sem perspectivas de melhoria a curto prazo. A mudança efetiva depende de reformas estruturais no Brasil para reduzir a desigualdade socioeconômica, ampliando o acesso à saúde, educação e trabalho, com maior inclusão social por meio de políticas públicas em nível federal, estadual e municipal.
Assista o vídeo:
Quer entender mais sobre como funciona os bastidores da política em Campinas e no Brasil? Acesse o link : https://www.paulogaspar.com.br/post/eles-n%C3%A3o-querem-que-voc%C3%AA-saiba
Importantes apontamentos. Queria destacar aqui que Paulo Gaspar em meio a esse debate complexo colocou uma iniciativa de política pública estratégica, que combina economicidade de recurso público, desburocratização de acesso e efetividade ao apresentar o Projeto de Lei para instituir o Moradia Primeiro